Por:Everson Salazar
As Sete Mais | Música
abr 2021
As Sete Mais Brasileiras, é o tema das próximas publicações musicais da coluna Tirando a Surdina do maestro Everson Salazar.
O maestro Everson Salazar, que é um apaixonado por música, mais especificamente big band, resolveu enumerar algumas músicas que são importantes na música brasileira, contam em sua poesia um pouco de história e que talvez muitos ainda não conhecem.
Confira abaixo as Sete Mais que você precisa parar tudo e ouvir agora!
“Meu Deus, quem diria que isso ia se acabar”
Frase emblemática que acostumados a ouvir em diversas situações, muitas vezes passa despercebida diante dos nossos sonhos, desejos, projetos e planos, mas sintetiza perfeitamente a efemeridade das fases do nosso estado de espírito e da nossa própria vida.
Samba de Breque, composição de Maurício Tapajós e Hermínio Bello de Carvalho, essa música ficou marcada na voz de Doris Monteiro, que posteriormente gravou com a participação do cantor de voz “possante” e também compositor Lúcio Alves.
Entretanto, Mudando de Conversa é uma melodia gostosa de se ouvir e ritmo envolvente, a letra dessa composição é mais um daqueles bate papos nostálgicos de quem sempre acreditou que a vida se resumiria apenas naqueles efêmeros momentos, que como sabemos, acabavam em samba da melhor qualidade.
Mudando de Conversa é mais uma das sete músicas que se você ainda não ouviu, pare tudo é vá ouvir agora!!
MUDANDO DE CONVERSA
Maurício Tapajós e Hermínio Bello de Carvalho
Mudando de conversa onde foi que ficou
Aquela velha amizade, aquele papo furado
Todo fim de noite num bar do Leblon
Meu Deus do céu, que tempo bom!
Tanto chopp gelado, confissões à bessa
Meu Deus, quem diria que isso ia se acabar
E acabava em samba
Que é a melhor maneira de se conversar
Mas tudo mudou, eu sinto tanta pena de não ser a mesma
Perdi a vontade de tomar meu chopp, de escrever meu samba
Me perdi de mim, não achei mais nada
O que vou fazer?
Mas eu queria tanto, precisava mesmo de abraçar você
De dizer as coisas que se acumularam
Que estão se perdendo sem explicação
E sem mais razão e sem mais porque
Confira abaixo Doris Monteiro e Lúcio Alves interpretando “Mudando de Conversa”.
No verão de 1994 fui participar de um festival de música em Curitiba, iniciando a minha carreira profissional. Retornando a Vitoria, tive um reencontro com essa música através do Quarteto em Cy, que fazia a interpretação de um arranjo muito interessante, com distribuição das vozes em blocos harmônicos, uma maravilha de se ouvir.
Assim como Carta Ao Tom 74, Samba de Orly é mais uma das cartas melódicas da qual Toquinho participa brilhantemente como compositor, dando vida musical as palavras de Vinícius de Moraes e Chico Buarque.
Orly é um aeroporto Parisiense e a música é uma despedida melancólica entre amigos, retratando a saudade de quem ficou, repressão e censura, que em função de suas orientações ideológicas, o melhor destino encontrado pela maioria dos “exilados” era a europa, evitando assim, um possível cerceamento de liberdade!
Samba de Orly é mais uma das sete músicas brasileiras, que se você ainda não ouviu, pare tudo e vá ouvir agora, e se você já ouviu, vale a pena escutar essa versão do Quarteto em Cy!
SAMBA DE ORLY
Chico Buarque / Toquinho / Vinícius de Moraes
Vai, meu irmão
Pega esse avião
Você tem razão de correr assim
Desse frio, mas veja
O meu Rio de Janeiro
Antes que um aventureiro
Lance mão
Pede perdão
Pela duração dessa temporada
Mas não diga nada
Que me viu chorando
E pros da pesada
Diz que eu vou levando
Vê como é que anda
Aquela vida à toa
E se puder me manda
Uma notícia boa
Pede perdão
Pela omissão um tanto forçada
Mas não diga nada
Que me viu chorando
E pros da pesada
Diz que eu vou levando
Vê como é que anda
Aquela vida à toa
Se puder me manda
Uma notícia boa
Confira abaixo o vídeo com o Quarto em Cy cantando “Samba de Orly”.
Carta ao Tom 74 é mais uma das sete músicas brasileiras que se você ainda não ouviu, precisa parar tudo e ouvir agora!”
Em 1974 a bossa nova ainda não tinha chegado a sua “maioridade”, mas já envolvia uma geração e influenciava o mundo com sua autenticidade.
Em tom nostálgico com lembranças de um tempo feliz, próspero de artistas que surgiam a cada instante, tendo Ipanema como um dos points de encontro dessa turma boa, muita coisa mudou e mudaria ainda mais a partir do advento bossa nova.
A sutileza em incorporar elementos já existentes em outras obras criadas por eles mesmo, como a “famosa Garota de Ipanema”, o “amor em paz”, “canção do amor demais”, citar a “Divina” Elizeth Cardoso, a paisagem da janela contemplando “um cantinho de céu” e o “Cristo Redentor”, tornam essa música indispensável para os que se permitem viajar para um Rio que outrora foi de paz e amor!
Toquinho e Vinícius de Moraes também exploram nessa melodia uma extensão musical mais apropriada a um mezzo-soprano ou barítono, devido ao seu agudo e grave em determinados pontos da música.
Escute essa canção e volte há alguns anos atrás, você vai querer morar nesse Rio de amor!
CARTA AO TOM 74
Toquinho / Vinícius de Moraes
Rua Nascimento Silva, cento e sete
Você ensinando pra Elizete
As canções de canção do amor demais
Lembra que tempo feliz, ai, que saudade
Ipanema era só felicidade
Era como se o amor doesse em paz
Nossa famosa garota nem sabia
A que ponto a cidade turvaria
Esse Rio de amor que se perdeu
Mesmo a tristeza da gente era mais bela
E além disso se via da janela
Um cantinho de céu e o Redentor
É, meu amigo, só resta uma certeza
É preciso acabar com essa tristeza
É preciso inventar de novo o amor
Linda canção dos compositores Altay Veloso e Paulo César Feital, que conta um pouco da história político-artística brasileira, num período de “40 Anos”.
Muito bem retratada poeticamente, 40 Anos é uma aula de história do Brasil, contada a partir da visão política da classe artística, num período que mesmo com suas “restrições” de liberdade, foi próspero em suas manifestações artísticas e culturais, com surgimento de célebres artistas, uma época realmente muito importante para a cultura do país.
A música aqui escolhida é interpretada pelo coral Tom da Terra, que canta com sutileza esse samba-funk, numa variação de vozes masculinas em uníssono com contraponto das vozes femininas e abertura harmônica das vozes mistas.
Essa também não poderia faltar nas sete músicas brasileiras que você precisa parar tudo e ouvir agora!
40 ANOS
Altay Veloso e Paulo César Feital
São 40 anos de aventuras, desde que mãe teve a doçura
De dar a luz pr’esse seu nego e a vida cheia de candura
Botou canção nesses meus dedos e me entregou uma partitura
Pra eu tocar o meu enredo
Sei que às vezes quase desatino, mas esse é o meu jeito latino
Meio Zumbi, Peri, D. Pedro, me emociona um violino
Mas também já chorei de medo, como chorei ouvindo o Hino
Quando morreu Tancredo
Dos 40 anos de aventuras, só 20 são de ditadura
E eu dormi, peguei no sono, e acordei no abandono
E o país ‘tava sem dono e nós, fora da lei
Quem se apaixonou por Che Guevara, até levou tapa na cara,
Melhor é mudar de assunto, “Vamo” enterrar esse defunto
Melhor lembrar de “Madalena”, de Glauber Rocha no cinema
Das cores desse mundo
Jimmy, Janis Joplin e John Lennon, meu Deus, o mundo era pequeno
E eu curtia no sereno, Gonzaguinha e Nascimento
O novo renascimento, que o galo cantava
“Ava Canoeiro”, “Travessia”. Zumbi no “Opinião” sorria,
De Elis surgia uma estrela, comprei ingressos só pra vê-la
Levei a minha namorada, com quem casei na “Disparada”
Só para não perdê-la
Lavei com meu pranto os desatinos, pra conversar com meus meninos
Sobre heróis da liberdade, de Agostinho de Luanda
A Buarque de Holanda, foram “sóis” na tempestade
Mesmo escondendo tristes fatos, curti meu tricampeonato
Porque também sou batuqueiro, como eu nasci em fevereiro
E o carnaval tá no meu sangue, sou dos palácios, sou do mangue,
Enfim, sou brasileiro
Sou Ayrton Senna, eu sou Hortência, dou de lambuja a minha vidência
Não conheço maior fé, que a de Chico Xavier
Que para Deus já é Pelé, que é o nosso rei da bola
Rola essa pelota companheira, judô pra que se a capoeira
Pode dar tombo em capataz, mandinga dou pra satanás
Se a Broadway conhecer Mangueira, Bumba meu boi, na alma estrangeira
Primeiro mundo, samba
Quem tem Raoni, tem Amazônia, se está sofrendo de insônia
É porque tem cabeça fraca, ou está deitado eternamente
Em berço esplêndido, ou é babaca, ou tá mamando nessa vaca
O leite dos inocentes
Vamos ensaiar, oh… minha gente,
Levar nosso Brasil pra frente
Laia, laia, laia, laia, Laia, laia, laia, laia, Laia,
laia, laia, laia…
Confira abaixo o vídeo com o Grupo Tom da Terra cantando “40 Anos”.
“Mas a orquestra sempre toma providência, tocando alto pra polícia não manjar
E nessa altura como parte da rotina, o piston tira a surdina e põe as coisas no lugar”.
Essa música é simplesmente maravilhosa. Harmônicamente caminha por uma trilha natural para um ouvido não muito treinado em escutar algo mais “sofisticado”, se assim podemos dizer.
No entanto, a letra também sugestivamente musical, retratando uma história ocorrida há algum tempo, pois nela observamos uma orquestra de gafieira animando o baile, o que já não é tão comum nos nossos dias.
A orquestra desde sempre é utilizada para o desenvolvimento coletivo nos cultos religiosos, encontros sociais e nessa música especialmente para o entretenimento e vejam só, para também disfarçar um tumulto aqui contado por Billy Branco. Essa música mostra a importância de um instrumento na orquestra, dado a sua pujança sonora, o trompete, aqui nominado “piston”, uma alusão aos seus três pistões, tira a surdina – acessório metálico que acoplado a campana do instrumento abafa o som, produzindo efeitos sonoros interessantes – e põe as coisas no lugar.
Em uma orquestra, tudo pode acontecer, todos instrumentos são importantes em suas relevâncias, mas o trompete é “âncora do navio” na tempestade.
Piston de Gafieira é mais uma das “sete músicas brasileiras que você precisa parar tudo e ouvir agora!”
PISTON DE GAFIEIRA
Na gafieira segue o baile calmamente
Com muita gente dando volta no salão
Tudo vai bem mas, eis, porém que de repente
Um pé subiu e alguém de cara foi ao chão
Não é que o Doca um crioulo comportado
Ficou tarado quando viu a Dagmar
Toda soltinha dentro de um vestido-saco
Tendo ao lado um cara fraco e foi tira-la pra dançar?
O moço era faixa preta, simplesmente
E fez o Doca rebolar sem bambolê
A porta fecha enquanto dura o vai-não-vai
Quem está fora não entra, quem está dentro não sai
Mas a orquestra sempre toma providência
Tocando alto pra polícia não manjar
E nessa altura como parte da rotina
O piston tira a surdina e põe as coisas no lugar
Confira abaixo o vídeo com o cantor Zeca Pagodinho cantando “Piston de Gafieira” com regência do maestro Leonardo Bruno
Particularmente eu gosto de histórias, histórias bem contadas, que te remetem para uma vida que não foi a sua, um tempo que não foi seu, mas que na imaginação você vive cada sensação proposta pelo contador.
Rio Antigo – Como Nos Velhos Tempos é uma delas que te envolve levando de volta ao passado e fazendo imaginar uma cidade maravilhosa no seu apogeu, com o surgimento de personalidades artísticas e esportivas que revolucionaram nossa geração com suas geniais criações e interpretações, situações que no Rio de hoje, “quem não viu não pode entender o que é paz e amor”.
Composição de Chico Anísio, ele mesmo, o imortal humorista brasileiro assina essa obra espetacular juntamente com o Nonato Buzar, que foi gravada pela cantora Alcione que dispensa comentários, num arranjo belíssimo com destaque especial para os trombones que fazem todo o contraponto melódico, dando ainda mais cor a essa sensação nostálgica e finaliza com um fragmento melódico da Valsa de Um Cidade (Antônio Maria Araújo de Morais).
Que privilégio poder ouvir e vibrar com uma música tão bela, que nos bailes da Vitória Café Orchestra sempre esteve presente na voz da nossa cantora Carmem Amorim com seu timbre diferenciado.
Não preciso dizer mais nada, você tem que ouvir e se divertir com esse samba que embalou as noites dançantes de muitos casais mundo afora!
RIO ANTIGO – COMO NOS VELHOS TEMPOS
Quero um bate-papo na esquina
Eu quero o Rio antigo com crianças na calçada
Brincando sem perigo sem metrô e sem frescão
O ontem no amanhã
Eu que pego o bonde 12 de Ipanema
Pra ver o Oscarito e o Grande Otelo no cinema
Domingo no Rian
Me deixa eu querer mais, mais paz
Um pregão de garrafeiro
Zizinho no gramado eu quero um samba sincopado
Taioba, bagageiro e o desafinado que o Jobim sacou
Quero o programa de calouros com Ary Barroso
O Lamartine me ensinando um lá, lá, lá, lá, lá, gostoso
Quero o Café Nice de onde o samba vem
Quero a Cinelândia estreando “E o Vento Levou”
Um velho samba do Ataulfo que ninguém jamais gravou
PRK 30 que valia 100 como nos velhos tempos
Um carnaval com serpentinas
Eu quero a Copa Roca de Brasil e Argentina
Os Anjos do Inferno, 4 Ases e Um Coringa
Eu quero, eu quero porque é bom
É que pego no meu rádio uma novela
Depois eu vou à Lapa, faço um lanche no Capela
Mais tarde eu e ela, pros lados do Hotel Leblon
Um som de fossa da Dolores
Uma valsa do Orestes, zum-zum-zum dos Cafajestes
Um bife lá no Lamas, cidade sem Aterro, como Deus criou
Quero o chá dançante lá no clube com Waldir Calmon
Trio de Ouro com a Dalva Estrela Dalva do Brasil
Quero o Sérgio Porto e o seu bom humor
Eu quero ver o show do Walter Pinto com mulheres mil
O Rio aceso em lampiões e violões que quem não viu
Não pode entender o que é paz e amor.
Confira abaixo o vídeo com a cantora Alcione cantando “Rio Antigo”
É uma das sete músicas brasileiras, que se você ainda não ouviu, precisa parar tudo e ouvir agora!
Certo dia em minha casa estudando o trombone, lá no início da minha carreira profissional, recebi um telefonema do Sr. Luiz Paixão um aficionado pelo jazz, que viajou no ônibus da orquestra do maestro Stan Kenton, pelo simples prazer de curtir o som de uma das maiores big bands da história. Acredite, o telefonema dele era pra eu ir a sua casa para escutar uma música de Rita Lee. O Sr. Luiz curte jazz e bossa nova, de repente me liga pra ouvir a “Rainha do Rock Brasileiro”, pensei, deve ser alguma observação não positiva.
Fui surpreendido com essa música sensacional interpretada por João Gilberto e Rita Lee. Uma bossa nova que traz em sua letra, peculiaridades do descobrimento, riquezas minerais, beleza natural e culinária da nossa terrinha.
Brasil com “S” é uma daquelas músicas gostosas de ouvir e não pode ficar fora das sete músicas brasileiras, que se você ainda não ouviu, precisa parar tudo e ouvir agora!
BRASIL COM “S”
Quando Cabral descobriu no Brasil o caminho das índias
Falou ao Pero Vaz para caminhar escrever para o rei
Que terra linda assim não há, com tico-ticos no fubá
Quem te conhece não esquece que o meu Brasil é com S
O caçador de esmeraldas achou uma mina de ouro
Caramuru deu chabu e casou com a filha do paje
Terra de encanto amor e sol, não fala inglês nem espanhol
Quem te conhece não esquece meu Brasil é com S
E pra quem gosta de boa comida aqui é um prato cheio
Até Dom Pedro abusou do tempero e não se segurou
Ó natureza generosa esta com tudo e não está prosa
Quem te conhece não esquece meu Brasil é com S
Na minha terra onde tudo na vida se da um jeitinho
Ainda hoje invasores namoram a tua beleza
Que confusão veja você, no mapa mundi está com Z
Quem te conhece não esquece meu Brasil é com S